17 dezembro 2010

12ª Lição- Platão- LivroX da República e Magritte



DESVALORIZAÇÃO da ARTE

As doutrinas estéticas de Platão são algo oscilantes entre uma valorização e uma desvalorização da arte. Em todo caso, no conjunto do seu pensamento, em oposição ao seu génio e ao génio artístico grego, prevalece a desvalorização por dois motivos um teórico e outro prático.
O motivo teórico é que a arte resultaria como cópia de uma cópia: cópia do mundo empírico, que é já uma cópia do mundo ideal; cópia não de essências, como a ciência, mas de fenómenos. Por consequência, a arte deveria ser, gnosiologicamente, inferior à ciência.
O motivo prático é que a arte, impura fonte gnosiológica - torna-se um tanto perigosa no campo moral. Actuando cegamente sobre o sentimento, a arte tanto atrai para o verdadeiro, como para o falso, para o bem como para o mal.


Na República a Arte é discutida do ponto de vista do educador, do homem de Estado.
Platão está interessado no aspecto social da obra de arte e não na obra de arte em si, nem no artista
Platão está consciente da importância e influência da arte na vida das pessoas:

Mas então só aos poetas é que devemos vigiar e forçá-los a introduzir nos seus versos a imagem do carácter bom, ou então a não poetarem entre nós? Ou devemos vigiar também os outros artistas e impedi-los de introduzir na sua obra o vício, a licença, a baixeza, o indecoro quer na pintura de seres vivos, quer nos edifícios, quer em qualquer outra obra de arte? E se não forem capazes disso, não deverão ser proibidos de exercer o seu mester entre nós?" (A República – 401b)





O que Platão disse sobre a arte, é que a arte é imitação. Esta afirmação não pode ser uma definição da arte, dado que, entendendo-a como uma definição, identifica a arte com a imitação, mas nem toda a imitação é arte.
A afirmação de Platão é, no melhor dos casos, uma definição parcial, quer dizer, a pressuposição de que a imitação é uma condição necessária para que algo seja arte.
Se Platão tivesse tido um interesse teórico centralizado na arte, quem sabe, teria tratado de especificar uma segunda condição ou um conjunto de condições ulteriores que distinguiriam aquelas imitações que são arte daquelas que não o são. Se tivesse feito esta especificação, então teríamos uma teoria platónica da arte.


A poesia só será permitida se imitar a verdade, a essência, e não se for uma imitação ignorante.


No livro X, Platão faz uma objecção às artes fundamentada na teoria das Ideias. (597a)
Os carpinteiros fazem camas, de todos os tipos, e o pintor ao pintar uma cama, reproduz apenas a sua aparência, vista de um ângulo particular e limitado



Há 3 níveis de realidade: Ideias, a Realidade Sensível e a Arte


-A Arte entendida como imitação, só deveria representar o que é bom e adequado à vida humana.
-Platão defende que o mal, as emoções fortes, e mesmo a representação do vento ou da tempestade, são de evitar.
-Nenhuma acção má pode ser representada em palco, poderia apenas ser narrada, mas não representada, como é o caso da Hybris, crime, na Tragédia

Platão justifica a expulsão dos poetas da cidade com o argumento de estes são excessivos e perigosos, e que seremos influenciados na nossa vida pelas emoções que a arte nos transmite, como a dor, a paixão, o ridículo, etc.:

“Se pensares que a parte da alma que há pouco contínhamos pela força, nos nossos desgostos pessoais, que tem sede de lágrimas e de gemidos em abundância, até se saciar, porque a sua natureza é tal que a leva a ter esses desejos, é , nessas alturas, a parte a que os poetas dão satisfação e regozijo.”
Platão- A República, (606 a)





É com base neste argumento que, Platão defende que somente se devem receber na cidade hinos aos deuses e encómios aos varões honestos e mais nada:

“Se porém, acolheres a Musa aprazível na lírica ou na epopeia, governarão a tua cidade o prazer e a dor, em lugar da lei e do princípio que a comunidade considere, em todas as circunstâncias, o melhor.” Platão, República, (607 a) pág. 475




Platão julga as artes segundo as suas possíveis consequências na vida social.
Na República e nas Leis, Platão condena a Tragédia por razões interessantes:
A Tragédia habitua o espectador a ver no palco ilustres heróis a sofrer, a queixarem-se e a leva que o espectador aprecie e sinta prazer ao ver o sofrimento do outro.

A discussão no livro X começa lembrando que muita da poesia foi rejeitada por ser mimética. (referência ao livro III- a poesia que imita de modo livre é rejeitada)
Seguidamente critica a Tragédia e a Comédia e mesmo a representação dos poemas de Homero, a que chama, o primeiro dos trágicos, porque na representação não há sentido crítico.
Muita poesia lírica não seria permitida na cidade ideal de Platão (mas também não seriam permitidos os oradores, sofistas).



Livro III da República:
Poesia narrativa: Ditirâmbica (relata, lê)
Poesia mimética: Tragédia e Comédia (representa)
Poesia Mista : Mistura as duas anteriores
A maioria da poesia está cheia de mentiras, de imoralidades, ódios, traições e relatos de violência. Deve ser rejeitada! A poesia só deve imitar homens de bem.
A poesia é criticada tendo em vista as suas consequências na educação dos Guardiões! Preocupação Moral


Rejeita em absoluto a Poesia!
Não deve ser executada nem ouvida
Critica a natureza da Mimesis (imita a realidade sensível)
Critica a actividade poética, os poetas não têm conhecimentos verdadeiros, iludem a inteligência dos espectadores
A poesia dirige-se à emoção e não à razão, o lado mais nobre da alma humana
No livro X a Mimesis é rejeitada por causas ontológicas, porque está três graus afastado das Ideias.
O pintor e o poeta são imitadores e não criadores!











Magritte- A Traição das Imagens

“The famous pipe. How people reproached me for it! And yet, could you stuff my pipe? No, it's just a representation, is it not? So if I had written on my picture "This is a pipe," I'd have been lying!” Magritte


Quando Magritte afirma “isto não é um cachimbo”, ele parece querer defender-se de Platão, ao afirmar que não tem a pretensão de imitar um cachimbo, ele está consciente que está a fazer uma mera representação.
Este pintor assume a sua intelectualidade e recusa a acusação de ignorância.

Para Platão, a arte deveria encaixar-se numa relação triádica entre o justo, o belo e o bom. Por ela tem um carácter enganador, falso, não deveria existir na cidade ideal.
A arte seria uma reprodução da coisa q existe por participação na ideia.
Magritte esvazia o recheio de uma realidade nessa obra; a materialidade, o físico é refutado por uma frase. Uma expressão é responsável pela quebra de perspectivas estéticas e visuais: N'est pas. É uma luta contra a tendência ilusória dos olhos, um rompimento da sensibilidade inconsciente.

O pintor e o poeta são imitadores. Assim como o primeiro imita, não aquilo que é verdadeiramente, mas o que aparenta ser, também o poeta faz o mesmo ao imitar todas as coisas sem as conhecer verdadeiramente. o imitador gera ilusão e aparenta conhecer, mesmo não conhecendo o objecto que imita em profundidade.


No início do livro X de A República, Platão expõe que a mimesis pode representar apenas um aspecto, seja ele frontal ou lateral de um objeto, e nunca o objeto como o todo. Sendo assim, a mimesis está ligada do múltiplo sensível, e não ao ser. É portanto contrária à ciência, pois trata do oposto do que é.

Os poetas, tinham por função a manutenção das tradições orais. A educação pela poesia visava manter o ethos e a educação. Platão faz uma analogia entre a atividade mimética dos pintores e os poetas, pois estes tratavam de diversos assuntos diferentes, da virtude e das coisas divinas, sendo mesmo uma espécie de enciclopédia tribal.

Platão conclui que a mimesis dos poetas é uma imitação de um simulacro da virtude.

A poesia imita o homem em todas as suas contradições internas, conflitos, felicidades e infelicidades.
E é ao representá-los que os coloca como verdades aparentes.
Com isso, a poesia dificulta a educação do homem, na medida em que dando à ilusão aparência de verdade, afasta-os do conhecimento, da verdade O poeta é, nas cidades comuns, um “formador de opinião”, já que cria os mitos fundadores da cultura.
Por isso, tal como os pintores, e ainda mais que eles, não têm lugar na cidade Ideal, cuja constituição é regida pela Filosofia.

A actividade poética, quando permite a contradição, faz parte de uma faculdade da alma que é contrária à ciência, pois se baseia no relato físico, sensível, que é alheio à razão.

Logo, mimesis está ligada à pior parte da alma, a parte das paixões, a concupiscência, que não tem em vista nada a de verdadeiro, e foge ao bom senso.

A Arte entendida como imitação, só deveria representar o que é bom e adequado à vida humana
Platão defende que o mal, as emoções fortes, e mesmo a representação do vento ou da tempestade, são de evitar.


Nenhuma acção má podia ser representada em palco, poderia apenas ser narrada, mas não representada, como é o caso da Hybris, crime, na Tragédia

Platão julga as artes segundo as suas possíveis consequências na vida social.

Na República e nas Leis, Platão condena a Tragédia por razões interessantes:
A Tragédia habitua o espectador a ver no palco ilustres heróis a sofrer, e isso leva a que o espectador aprecie e sinta prazer ao ver o sofrimento do outro.

Rejeita em absoluto a Poesia!
Não deve ser executada nem ouvida

Critica a natureza da Mimesis (imita a realidade sensível)
Critica a actividade poética, os poetas não têm conhecimentos verdadeiros, iludem a inteligência dos espectadores A Poesia é imoral, representa os vícios e as fraquezas. Dirige-se à emoção e não à razão, o lado mais nobre da alma humana.
O pintor e o poeta são imitadores ignorantes e não criadores!

Foi o próprio Platão a chamar a atenção para a existência de "um grande combate" (608b), aquele travado entre a razão e a imagem, entre o discurso racional e as artes (miméticas),
o "antigo diferendo entre a filosofia e a poesia" (607b)

A mímesis seria responsabilizada por oferecer apenas ausência, falta, simulacro, aparência e, ao mesmo tempo, através dos seus poderes excessivos, a sua força extraordinária de arrebatamento e atracção para as emoções e não para a razão.

Além de executar suas obras "longe da verdade", a pintura, a poesia, todas artes miméticas de um modo geral, colocam-nos ante a parte em nós mesmos mais distante do bom-senso (603b), do razoável e da lei e, no entanto, insiste Platão, a melhor parte de nós seria aquela que quer seguir a razão, sendo a outra aquela "que nos leva à recordação do sofrimento e aos gemidos e que nunca se sacia deles" (604d).
Essa parte fraca, irracional, propensa à covardia, mostra-se exactamente como material perfeito para a imitação, "ao passo que o carácter sensato e calmo, sempre igual a si mesmo, nem é fácil de imitar nem, quando se imita, é fácil de compreender", sobretudo quando se trata da arte produzida para os festivais dramáticos, em que se apresentavam as tragédias (604d1e).

11 dezembro 2010

11ª Lição - Hípias Maior (Platão)

PLATÃO- HÍPIAS MAIOR


- O Hípias Maior, tem o privilégio singular de ser o primeiro dos diálogos estéticos consagrados ao tema do ‘Belo’.

- Diálogo da juventude (primeira fase - socrática) de Platão

- Quais as suas fontes estéticas?
É um diálogo refutativo e anti-sofístico, que visa destruir os antigos argumentos e impor um sistema novo
Tenta de alguma maneira varrer as teorias mitológicas, nomeadamente a que se prende com Apolo, deus da poesia e da música e as teorias mitológicas acerca das musas




Diálogo com o sofista Hípias de Atenas.
Indagação sobre o Belo

1. Sócrates elogia (ironicamente) Hípias pela sua sabedoria, própria dos sofistas, que para além de dominarem a esfera pública e privada, ainda recebem grandes lucros.
Hípias gaba-se bastante dos seus dons oratórios
Sócrates questiona-o acerca da questão da educação, uma vez que os sofistas são os “mestres da virtude.

2. Hípias vê-se num impasse, obrigado a reconhecer que não consegue transmitir a arete (virtude) aos habitantes de Lacedemónios, que por se considerarem virtuosos por natureza não aceitam essa lição de um sofista estrangeiro
Hípias admite no entanto que eles são capazes de escutar os seus discursos com interesse, como o último discurso que lhes fez intitulado “As Belas ocupações”
É aqui que se introduz o tema do Belo

4. Sócrates pergunta-lhe de forma insistente: “O que é o Belo?”
Hípias desvaloriza, referindo-se à insignificância da pergunta
Hípias começa por cometer um erro, que é não distinguir entre o conceito e o exemplo de belo.
Revela incapacidade de abstracção lógica
“O belo é uma bela rapariga, uma bela lira, uma bela marmita…”

5. Hípias cai no Relativismo
Sócrates indaga-o acerca do Belo em si
Belo em si, aquilo que é comum a todas as coisas belas, a razão de ser da beleza das coisas
Sócrates procura o eidos, o carácter
“o belo em si não é nem este objecto nem aquele, mas qualquer coisa que lhe comunica o seu próprio carácter
A segunda tentativa de Hípias também é falhada: “o belo é o ouro”
Cai em contradição, pois Sócrates mostra-lhe exemplos em que esculturas noutros materiais podem também ser belas
Hípias conclui que uma coisa é mais bela quando é apropriada à sua função: uma colher de pau é mais bela para fazer um puré do que uma de ouro…
Hípias defende que a beleza é a Conveniência
Sócrates vai rapidamente refutar esta resposta: a conveniência é uma relação entre vários objectos, logo entre as partes de um todo. Se as partes são belas a beleza não vem da sua disposição, e se as partes não são belas a disposição só pode produzir a aparência do belo
Surge então a segunda tentativa de definição: o belo é o útil


6. Hípias vai, pois, representar no diálogo a opinião da maioria. Contudo, Hípias é ao mesmo tempo considerado o Saber Supremo, para si e para a sociedade do seu tempo, – com a maioria e o senso comum – o expoente máximo do pensamento racional, no domínio da lógica, da matemática, da ciência. Neste sentido, para Hípias (qualquer hípias) não existe Sabedoria (Arte ou Dialéctica) mais além dos seus próprios limites – não lhe é concebível (tal como nos dias de hoje), pois não é uma questão de vontade, é algo ausente da sua mentalidade e de que jamais terá consciência – jamais poderá alcançar o Belo (a Arte) e a Dialéctica.

7. O Belo é um prazer inteligível, dado pelo reconhecimento no espírito da ideia da realidade do objecto, do facto, por isso só apreensível pelo ver ou pelo ouvir (os dois sentidos que transportam o mundo exterior ao inteligível), ou pelos dois sentidos em conjunto.
Todavia, não apenas pela vista ou pelo ouvido, pela percepção do objecto, considerando que não é propriedade dos sentidos, pois apenas passa por eles para se manifestar no espírito, ao inteligível, pela noésis.
Como a Dialéctica, desenvolve-se a partir das mais intimas zonas do Ser (do sensível ao afectivo e emocional), enraizando-se nos seus desejos mais profundos, percorrendo o racional e ultrapassando-o, emergindo no espírito como uma clarividência.
Hípias está muito longe de compreender ou apreender isso, e Sócrates reconhece que só por vezes tais coisas lhe passam pela cabeça.

6. O Belo é a potência para se fazer alguma coisa: “um belo atleta”, “um belo navio”
Aptidão para atingir um fim
Sócrates vai testar esta afirmação, reflectindo acerca das consequências
E se o fim a atingir for mau?
Não é admissível que o que é belo não seja bom e vice-versa
Então Hípias corrige de “Útil” para “Proveitoso”

7. A discussão passa para o plano da ética
Na verdade continuamos no campo do concreto e não do abstracto (belo em si continua por definir)
“O belo é a causa do Bem”
Esta definição é também rejeitada por Sócrates
A beleza visual, das pessoas e das obras de arte, bem como a beleza auditiva, das vozes das musas, da lira, conduz a uma nova definição:
O Belo é o que é agradável à vista e ao ouvido



8. A qualidade “agradável” não serve para caracterizar a beleza, pois nesse caso todos os restantes prazeres, incluindo os mais feios, seriam belos, o que não faz sentido.
Hípias insiste no agradável unicamente à vista e ao ouvido e tentar ainda pegar no conceito “proveitoso” anteriormente rejeitado.
Defesa do prazer com metron, medida. O ouvido e a vista através das artes que representam, música, pintura, escultura e arquitectura usam a métrica e os canons que se fundamentam no número (elemento inteligível entre o sensualismo do prazer).
Mais uma vez cai na aporia de juntar no belo o ético e o estético e de continuar a falar de coisas belas e não do Belo em si.
Ambos concluem que “o Belo é difícil.”