19 abril 2011

2ºS. 8ª Lição- Pintura e Desenho: Noção indiferenciada; Originalidade da Ideia

Holanda não se cansa de louvar o desenho. Para ele nada é mais difícil que o desenho
A sua defesa do desenho a partir do esquisso, como momento projectual e estrutural leva-o a valorizar o desenho por si só.
“vale mais um só risco (…) pela mestria de um valente desenhador, que uma pintura (…) cheia de muitas personagens” (PA, pag. 45)

O desenho é a “coluna” da pintura e não mero género da pintura, ideia que é confirmada pelo próprio, logo em seguida:
“E quem souber com uma pena bem desenhar, saiba certo que não somente é senhor de todos os géneros de pintura, mas que de todas as mais ciências ou ofícios deste mundo tem já sabido a mor parte (...)” [PA, pág. 87]

Holanda parece apresentar-nos uma noção abrangente de Pintura, o que pode ser facilmente confirmado no Capítulo 44º do Da Pintura Antiga. Aqui Holanda apresenta como primeiro género da Pintura, a pintura a gráfio, ou regrão ou estilo, instrumentos de desenho e de delineação. [PA pág. 87]
Se por um lado parece que a Pintura é um saber vastíssimo onde o “desenho a gráfio” se inclui como mais um género ou modo de pintar, diz também:
“O gráfio é o primeiro (…) O segundo instrumento e mais nobre e difícil é com a pena desenhar e lançar as linhas e perfil de toda a gravíssima ciência da pintura, e esta é a coluna desta arte.”
PA pág. 87]

Para Holanda, a “Pintura” tem um significado próprio e simbólico: é uma sabedoria vastíssima, com a capacidade de incluir em si todas as artes visuais possíveis, a arte do mosaico, o baixo-relevo, a escultura, a gravura e até numa precursora noção de design (forma e função) bem presente na sua obra através da inclusão de escudos, brasões, medalhas, divisas, alimárias, invenções de armaria, etc.

O denominador comum de todos estes tipos de "pintura" reside no desenho, enquanto mãe de todos as artes, mesmo aquelas mais recentes, como o design ou as ditas artes decorativas que Holanda cita. A valorização do desenho é típica da própria atitude renascentista. Diz Holanda em Diálogos em Roma, pela boca de Miguel Ângelo, falando acerca da nobre arte da pintura:
“Entenda bem nisto todo o homem que chegar aqui: o desenho, a que por outro nome chamam debuxo, nele consiste e ele é a fonte e o corpo da pintura e da escultura e da arquitectura e de todo o outro género de pintar e a raiz de todas as ciências. (...) E porque grande, mui grande, é a força do desenho ou debuxo, pode Messer Francisco d’ Ollanda pintar, se ele quiser, tudo o que ele sabe desenhar.” [DR, pág. 61-62]

Esta ideia que Miguel Ângelo defende, de que o desenho é fonte e corpo da pintura, vem ao encontro daquela que Francisco de Holanda defende no Da Pintura Antiga quando afirma que “o desenho é coluna da pintura,” [PA, pág. 87] mas é em Diálogos em Roma, pela voz de Miguel Ângelo, que Holanda desenvolverá uma ideia sempre presente na sua obra.
Esta imprecisão ou confusão voluntária de Holanda entre os termos Pintura e Desenho e na sua vasta aplicação a todas as artes, é tão flagrante que M. Lactâncio, nos Diálogos em Roma, questiona Holanda a esse respeito:
"Parece-me, disse M. Lactâncio, que senti a Francisco de Holanda numerar entre as obras da pintura, há pouco, a sepultura que, senhor Micael, esculpistes em mármore; e não sei como isto pode ser, que a escultura nomeeis por pintura."[DR, pág. 42]

A resposta de Holanda é conclusiva, e assumida em total comunhão com Miguel Ângelo. Defende que todos os ofícios que tenham arte, razão e graça, descendem da Pintura.[DR, pág. 42]





Algum tempo depois, no Ciência do Desenho, Holanda sente necessidade de clarificar a noção de pintura. Afirma que a noção de pintura tem sido muito mal entendida. A Pintura da qual Holanda fala e que tem esse poder de ser uma ciência universal, não é pintar nem desenhar, mas trata-se do Desegno. O Desegno, é um dom divino, existente no entendimento e Imaginação da criatura humana, à imagem do Desegno, “eterna sciencia increada”[1] existente no entendimento divino.
A causa de todas as artes e ofícios, diz Holanda é este Desegno sagrado existente no entendimento de Deus. E diz um pouco mais à frente que a glória desta arte não pertence a Apeles, nem a Miguel Ângelo nem a si próprio:
“(...) mas ao Dador e Inventor de todos os entendimentos, que é Deos (...) Assi que seja Elle por isto de infinita glória como merece louvado: e eu abatido como inutil que sou.”, [Da Ciência do Desenho- Fac-simile in Jorge Segurado- FranciscoD’ollanda. Lisboa: Edições Excelcior, 1970, pág, 139]



















O tema da Ideia tem obviamente influência platónica.

Apesar da rejeição que Platão faz da Imagem e do Artista, houve na filosofia neoplatónica uma tentativa de associar Ideia a Imagem.
As ideias da Geometria sempre estiveram ligadas à imagem, apesar de ser um conhecimento abstracto e objectivo, não pode existir sem imagens
Para Platão os artistas eram fazedores de imagens, três graus afastados da Realidade.
Há várias referências na Antiguidade que apontam para a ligação entre ideias e imagens, entre as Ideias de Platão e a Criação Artística.
Cícero refere como o escultor Fídias copiava a “imagem mental” da perfeição divina para criar as suas estátuas de deuses.
“E quando este artista trabalhava a criação de seu Zeus ou de sua Atena, ele não observava um homem qualquer, isto é realmente existente que ele pudesse imitar, pois era na sua mente que residia a representação sublime da Beleza.”
Cícero: Orator ad Brutum (II-9 e III-10)

Aqui o artista não é visto como mero imitador dos objectos do mundo sensível, mas sobretudo como artista criador que possuí no seu pensamento uma imagem interior, que ainda que não possa transmitir na íntegra para a obra de arte por si criada, contém em si uma beleza muito superior à da simples cópia da realidade sensível, uma vez que é apresentada no interior da mente do artista e não no exterior.
Assim sendo, o processo criativo não estaria sujeito aos enganosos orgãos dos sentidos, e a cadeia descrita no Livro X da Républica descrevendo a arte como cópia da cópia deixa de se aplicar a este caso. Podemos dizer que de alguma maneira se defende uma autonomia da arte face à realidade aparente.

Esta associação entre Ideia e criação artística confere ao artista uma superiorização, uma vez que o artista é aquele que está em contacto com o divino através do pensamento.
Plotino dirá que Fídias deu à sua estátua os traços com os quais o próprio Zeus teria aparecido se quisesse revelar-se ao nosso olhar. (Eneida, V, 8,1)




Estas referências da Antiguidade são fundamentais para o Renascimento

O pintor, tal como o filósofo ou o místico aspira a alcançar uma elevação metafísica e transcendental.
O Renascimento só se começa a interessar pela “Ideia” a partir do séc. XVI, com o Maneirismo:
- Francisco de Holanda
- Paolo Lomazzo
- Frederico Zuccaro

Apesar de toda a filosofia neoplatónica de Ficino e Landino, estes autores nunca fazem associar a noção de “Ideia” à de “criação artística”.
São dois artistas que fazem esta associação no Renascimento: Miguel Ângelo e Dürer: “Um bom pintor está repleto de formas dentro de si próprio e, supondo que ele pudesse viver eternamente, encontraria nas Ideias Interiores, de que Platão fala nos seus escritos, onde ir buscar sempre algo de novo para introduzir nas suas obras” Panofsky- “Ideia”, 1983, pág. 148

As Ideias interiores de que Dürer fala aproximam-se mais da concepção neoplatónica da qual Holanda participa do que da concepção verdadeiramente renascentista, e isto numa época em que tais afirmações eram verdadeiramente originais, como esta noção de que o artista pode retirar do seu espírito sempre algo de novo:
“La doctrina de las Ideas, que adquiren aquí casi el carácter de inspiraciones, se acomoda a aquel concepto romántico del genio que ve el rasgo distintivo del verdadero arte no en la exactitud y en la belleza, sino en una infinita plenitud creadora, siempre original y sin precedentes.[1]” Panofsky, , Idea, Contribucíon a la historia de la teoría del arte, Madrid: Ediciones Cátedra, 1977, pág. 110

É a partir de Miguel Ângelo que podemos encontrar a introdução de ideias platónicas na teoria da arte.
Francisco de Holanda é testemunha disto. M. Ângelo usa um vocabulário simples, não recorre a termos filosóficos mas antes àqueles que são próprios da linguagem de um artista.
Miguel Ângelo usa termos como: Ideia, exemplo, norma, forma, conceito, espelho, etc…
Na obra “Idea”, Panofsky, não faz qualquer alusão a Holanda, autor que ele desconhecia totalmente.
Panofsky afirma que o termo Ideia associado à Criação Artística, só surge no Maneirismo tardio, séc. XVII
Se este tivesse lido o Da Pintura Antiga, teria constatado que havia um tratado neoplatónico de Pintura em pleno séc. XVI, que refere a IDEIA.

Holanda fala de Ideia 60 anos antes de Zuccaro e 40 anos antes de Lomazzo
O conceito de Ideia com uma conotação metafísica associado à criação artística surge pela primeira vez com Francisco de Holanda e não no Maneirismo tardio como disse Panofsky.
Nas Vidas de Vasari, a dimensão filosófica de Miguel Ângelo é esquecida, daí a grande importância da obra de Holanda.
Holanda tal como M. Ângelo defende que a Ideia é a força da Pintura, é o a priori sem o qual nada se cria.
M. Ângelo acreditava que desbastando o mármore encontraria a Ideia que conduzia a sua criação.





12 abril 2011

2ºS. 7ª Lição- Francisco de Holanda: Metodologia da Pintura; Importância da Ideia

Metodologia da Pintura

O processo artístico deverá obedecer a um método, que o acompanhe desde o momento da concepção da obra até à sua plena concretização. Podemos por isso falar de uma metodologia da pintura, exposta sob a forma de princípios a que a pintura se deve submeter, e vem responder à necessidade de legitimar cientificamente o processo artístico.
À pintura atribui três partes, (1) a Ideia, a (2) Proporção e o (3) Decoro, expostas de forma extremamente claras:
"E forma-se de três eficazes preceitos, que a têm como colunas, sem as quais não pode estar. O primeiro é a invenção ou ideia; o segundo é proporção ou simetria; a terceira é decoro ou decência (...)"[PA pág. 21]

A primeira, a IDEIA, é a que tem maior importância e significado para Holanda.
“E sendo a mais nobre parte da pintura, não se vê de fora, nem se faz com a mão, mas somente com a grande fantasia e a imaginação”[PA, pág. 42]
A concepção da ideia, dá-se com muito cuidado e advertência. É uma longa meditação prudente que tem lugar na imaginação. A ideia é génese interior, mas também é ordem e selecção.
Para Holanda, quando a ideia está concebida, então, o artista já pode “dar por assegurado aquilo que tinha por incerto, guardado no lugar mais secreto que temos.[PA pág 43]”
Deste primado da ideia, decorre que a criação artística é um acto individual e intransmissível, que tem lugar no pensamento humano.
“A ideia na pintura é uma imagem que há-de ver o entendimento do pintor com olhos interiores em grandíssimo silêncio e segredo, a qual há-de imaginar e escolher a mais rara e excelente que a sua imaginação e prudência puder alcançar (...)”[PA pág. 43]

A Imaginação é a faculdade da Ideia. A ideia manifesta-se em imagens interiores. A obra de arte faz-se no momento da sua concepção mental, já como obra em imagem. A faculdade da imaginação, não tem em Holanda um carácter intuitivo. Há uma identificação entre o entendimento e a imaginação.
Holanda confere ao entendimento imagético, a produção de ideias-imagens e a selecção de imagens, daí que retire ao conceito de ideia, qualquer noção de natureza abstracizante. Aqui, a ideia holandiana distingue-se da ideia platónica que está mais próxima de conceitos matemáticos e de uma noção arquetipal que enforma uma multiplicidade empírica.
Em Platão, as ideias caracterizam-se como causa e modelo da realidade empírica, tendo uma existência independente do mundo sensível. As ideias são para Platão, a verdadeira realidade, o ser em si, a fonte e o fito do verdadeiro conhecimento. As ideias platónicas são entidades arquetipais e por isso, fundamento da diversidade sensível.
A ideia em Holanda não é universal, nem essência do múltiplo, é arquétipo de uma obra singular. Holanda transforma a ideia em princípio de produção, o que vem contrariar a tese platónica, na qual as ideias só poderiam ser alvo de contemplação. Na imaginação do artista, cada ideia dá origem a uma obra de arte singular, que é modelo interior e único do artista que a concebe.

Holanda afirma que o artista irá:
“(...) mostrar fora com a obra de suas mãos propriamente, como o concebeu e viu dentro em seu entendimento.”[PA pág. 43]

Holanda defende a precedência da ideia no processo criativo, socorrendo-se do exemplo divino:
“Dizem os filósofos que o sumo inventor e imortal Deus, quando fez as suas obras tais como ele só entende e conhece, que primeiro no seu altíssimo entendimento fez e teve os exemplos e ideias das obras que depois vieram a ser.”[PA pág. 44]

A mente artística, à semelhança do entendimento divino, possui a função de criar arquétipos, mas não de uma multiplicidade, tal como o entendimento divino é capaz, mas antes de uma obra particular.
A teoria das Ideias em Platão está em íntima sintonia com a teoria da Reminiscência, e é possível sentir em Holanda um eco dessa sintonia:
A boa pintura não é outra coisa senão um traslado das perfeições de Deus e uma lembrança do seu pintar, finalmente uma música e uma melodia que somente o intelecto pode sentir, a grande dificuldade.[DR, pág 30]

A ideia é criativa no sentido poético, pois é por seu intermédio que se passa do não ser ao ser. A ideia é espontaneidade da mente do artista e é expressão da sua individualidade, uma vez que não é obtida por indução da multiplicidade empírica, mas antes, é contemplação interna, é obra do entendimento e do espírito
Esquisso são as primeiras linhas ou traços que se fazem com a pena, ou com o carvão, dados com grande mestria e depressa, os quais traços compreendem a ideia e invenção do que queremos fazer, e ordenam o desenho;[PA, pág. 45]








DO Esquisso ao Desenho

O esquisso é o momento primordial que tem o privilégio de ainda não obedecer a regras racionais, é a manifestação da ideia, que se dá quase de forma automática e incontrolável, em obediência ao divino furor. O esquisso é a primeira revelação da ideia.
Diz Holanda que o esquisso compreende a ideia do que se quer fazer e que ordena o desenho. Podemos dizer que o esquisso é de alguma maneira a intimidade do próprio artista que cria livremente a partir da sua ideia interior.
E digamos assim: logo como a ideia está determinada e escolhida, como se quer pôr em obra, far-se-á logo em Desenho; e primeiro que este se faça ainda em sua perfeição, se faz o esquisso, ou modelo dele.”[PA, pág. 44]
O esquisso dá origem ao desenho limando-o e ajuntando-o pouco a pouco[PA, pág. 45]. 

O desenho parece sustentar os pilares da obra e também da racionalidade, pois nele estão reunidos: a ideia, a proporção e o decoro, ou seja, os três preceitos da pintura:
“O qual desenho, como digo, tem toda a substância e ossos da pintura: antes é a mesma pintura, porque nele está ajuntado a ideia ou invenção, a proporção ou simetria, o decoro ou decência, a graça e a venustidade, a comparticipação e a fermosura, das quais é formada esta ciência.”[PA, pág. 45]

O desenho é a mãe de todas as artes, daí que, não passando da linha que contorna as figuras, nele está contido todo o poder da pintura ou da escultura, ou da arte que o desenho informa:
“E em tanto ponho o desenho, que me atreverei a mostrar como tudo o que se faz em este mundo é desenhar; e falando com os pintores, também me atrevo a provar-lhes e fazer-lhes bom que vale mais um só risco ou borrão dado pela mestria de um valente desenhador, que não já uma pintura muito limpa e lisa e dourada e cheia de muitas personagens feitas de incerta pintura e sem a gravidade do desenho.”[PA, pág. 45]



PROPORÇÃO

A Proporção é o segundo preceito da pintura e está intimamente ligado à noção de desenho, constituindo assim a estrutura comum a todas as formas de expressão plástica em função da medida ou «razão» original, segundo a qual foi criado o universo.
A proporção é a coluna que sustenta o desenho. Manifesta-se através da simetria ou do canon.
A medida será o corpo humano, à imagem da Antiguidade e recorrendo talvez ao célebre preceito de Protágoras que diz ser o homem a medida de todas as coisas.
O corpo humano é a medida do canon, num módulo de 1/10, e numa base de correspondências, que se estende para a arquitectura, como por exemplo, nos templos dos deuses, diz Holanda, seguindo Vitrúvio:
“Mas o corpo do homem desta arte o compôs a natureza: que o rosto, da barba até o fim da testa e raiz dos cabelos, seja a sua décima parte.” [PA, pág. 46]



DECORO

O Decoro ou Decência é a terceira fase. Apesar do uso deste último termo, Decência, o desenvolvimento deste tema, não trata minimamente de aspectos de ordem moral, mas antes a sua preocupação é exclusivamente estética. Holanda diz que o decoro está presente em quase todas as disciplinas da pintura, isto é, tem de haver decoro no uso das cores, na história que se representa, nas proporções, etc.
Conceito que se prende com o sentido, a coerência interna e a harmonia geral da obra
Ao longo do capítulo 38º Do Decoro ou da Decência, nunca nos apresenta uma definição clara, mas antes exemplos
Holanda em vez de definir a palavra decoro, vai ilustrá-la com um exemplo bastante esclarecedor:
Mas propriamente o que chamo decoro na pintura é que aquela figura ou imagem que pintamos, se há-de ser triste ou agravada, que não tenha ao redor jardins pintados nem caças, nem outras graças e alegrias; mas antes que pareça que até as pedras e as árvores, e as alimárias e os homens sentem e ajudam mais sua tristeza, que não há alguma coisa sensível nem insensível ao redor da pessoa triste e agravada que não agrave e faça condoer mais dela aos que a olham.[PA, pág. 74]

Como podemos constatar, trata-se da adequação entre a forma e o seu significado. É a correspondência entre o visível e o invisível. O decoro é esta capacidade de captar a emoção, um estado de alma, ou seja o estado interior ou psicológico na pintura, e ser capaz de o expressar com fidelidade e com sentido.
O decoro surge como exigência de coerência, de profunda influência aristotélica. (Verosimilhança- Poética)
Trata-se da coerência entre o interior e o exterior, de modo que a obra de arte nos remeta para um todo com sentido.
Daí que Holanda nos diga, que não faria nenhum sentido evitar que um mancebo seja representado, por exemplo, com mãos ou pés de velho.
Faz também parte do decoro o bom senso na selecção de imagens, porque:
“(...) a pintura, tanto há-de ser feita daquilo que se nela faz, como do que se deixa de fazer. E se as figuras forem poucas ou se forem muitas, a ordem que eu nelas emendaria, seria que não ocupassem confusamente toda a tábua ou lugar onde se põem, mas que deixem alguns espaços vazios e dilatados para darem despejo e clareza à sua obra (...)”[PA, pág. 61]

Holanda associa a escolha do formoso e grave com a contenção e simplicidade, numa lógica de economia de meios representativos, em que a tónica é a selecção de imagens.
Holanda adverte que o melhor é fazer um pouco de cada coisa numa pintura, sem excessos e com equilíbrio. Mais vale que esse pouco que é feito seja feito com tal mestria e perfeição que valha mais do que aquela pintura com muitas coisas ao mesmo tempo e sem qualidade.
Esta advertência de Holanda a respeito do decoro, remete-nos para os Diálogos em Roma, quando a respeito da pintura da Flandres, Miguel Ângelo dirá que em Flandres, pintam para enganar a vista, e enchem a pintura de muitas figuras, mas:
(...) na verdade é feito sem razão nem arte, sem simetria nem proporção, sem advertência do escolher nem despejo, e finalmente sem nenhuma substância nem nervo (...) porque quer fazer tanta coisa bem (cada uma das quais, só, bastava por mui grande) que não faz nenhuma bem.[DR, pág. 29-30]

Podemos então concluir que o que falta essencialmente à pintura da Flandres é esta regra do Decoro, esta espécie de justa-medida, à maneira aristotélica, que confere à pintura a naturalidade e a coerência de um todo com sentido. Para que o pintor obtenha o grau de perfeição desejado numa obra de arte, o resultado deve ser:
“Com grande soma de trabalho e de estudo, fazer a coisa de maneira que pareça, depois de mui trabalhada, que foi feita quase depressa e quase sem nenhum trabalho, e muito levemente, não sendo assim.”[PA, pág. 64 ]

03 abril 2011

2ºS. 6ª Lição- Francisco de Holanda e a Metafisica da Criação

Analisaremos primeiro a Biografia de Francisco de Holanda, pois esta, bem como as vicissitudes históricas e os contextos que envolvem a sua vida são da maior relevância para a sua Estética.





Francisco de Holanda nasce em Lisboa, no ano de 1517, conforme o próprio refere no Da Pintura Antigua. É filho de António de Holanda, artista destacado, iluminador, que obtivera uma posição importante na corte portuguesa no tempo de Dom Manuel.
Passou a sua juventude em Évora, capital cultural portuguesa na época, factor que será decisivo para a sua educação, pois é lá, que recebe uma extraordinária formação humanista, apenas possível nesta cidade, que acolhia D. João III.
Aqui se manifesta uma apetência pelos valores e ideais humanistas, representados por personalidades como André de Resende, o escultor Nicolau Chanterenne que aí reside entre 1533 e 1540, Aires Barbosa, Miguel da Silva, Nicolau Clenardo, etc.
O século XVI, foi em Portugal o século do enraizamento da cultura humanista. A corte contribuiu para esse facto através do recrutamento de humanistas italianos para educar os príncipes e também por enviar portugueses para estudar em Itália. Holanda irá beneficiar de todo este contexto italianizante bem como da sua estreita vivência cortesã.
Com a deslocação da corte para a cidade de Évora, para lá se deslocaram os artistas e também mestres estrangeiros que se fixaram em Portugal, o que contribuiu para a fixação de uma comunidade artística e literária em Évora. O humanismo português é um movimento que se dava exclusivamente em torno da vida da corte e da experiência cortesã.

Infelizmente o entusiasmo humanista do Rei D. João III será breve, e terminará em 1555, com a entrega do ensino à Companhia de Jesus que acompanha uma mudança radical na atitude do monarca: de humanista a fanático, tornando-se subserviente ao poder da igreja e permeável à introdução da inquisição em 1536, pois o movimento luterano era já uma realidade europeia.

Pensa-se que foi na cidade de Évora, que Holanda adquiriu grande parte dos seus conhecimentos, quer em termos artísticos, quer teórico-literários, uma vez que, a sua vasta cultura, não poderia ter sido adquirida apenas, no curto espaço de tempo que passara em Itália. Os seus escritos testemunham a sua profunda erudição, quer na diversidade e multiplicidade de fontes citadas, quer no domínio das línguas clássicas e do italiano.
A vivência em Évora permitiu-lhe o contacto com algumas das poucas antiguidades, ruínas romanas que o nosso país possui, vivência essa que será decisiva no seu desejo de aprofundamento desse saber, e no seu desejo de conhecer Roma, local mítico para Holanda por representar a fusão do Antigo-Novo.

É também em Évora que Holanda contacta com Dom Miguel da Silva, que passara mais de dez anos em Roma, na idade de ouro de Leão X e Clemente VII, como embaixador do Rei de Portugal, habituado a uma vida luxuosa e cosmopolita em pleno apogeu do Renascimento. Era amigo de Rafael e de grandes vultos da Itália renascentista, teve um papel activo na vida cultural de Roma. D. Miguel da Silva trouxe para Portugal na sua rica biblioteca, uma série de obras que lhe foram dedicadas, entre elas, a que Baltassare Castiglione dedica, em 1528, o Libro del Cortegiano, obra que é uma das primeiras leituras de Holanda sobre Itália e que é também uma das principais obras da literatura renascentista, e também o Paraphrasis in Politicum Platonis de Francesco Cattani da Diacceto, discípulo e sucessor de Marsilio Ficino, ambos fontes do Da Pintura Antigua.



Com apenas vinte anos de idade, em Janeiro de 1538, Francisco de Holanda parte para Itália, integrando a embaixada de D. Pedro Mascaranhas, na qualidade de cortesão:
Esta intenção de Dom João III, de o enviar a Itália, revela bem a sua política humanista e o apreço e confiança que depositara no jovem Francisco de Holanda. É sob o impulso de D. João III, que se dá aquilo a que se pode chamar, a introdução de certos valores estéticos do Renascimento em Portugal. Sabe-se que D. João III, para além do mecenato e humanismo, também tinha interesses pragmáticos de estratégia militar.
Holanda percorreu grande parte de Itália, animado pelo espírito de conhecer e desenhar as obras da Antiguidade, mas também a arte italiana, o antigo–novo, e absorver todos os valores renascentistas que estivessem ao seu alcance. Os ideais do Renascimento que animam o jovem Francisco de Holanda estão bem patentes no Álbum das Antigualhas, no qual estão presentes aspectos pictóricos, poéticos, históricos, culturais.
É ainda em 1538 que chega finalmente a Roma, onde é muito bem recebido, sem dúvida, em virtude das cartas de recomendação que leva. Aí permanecerá mais de um ano. A protecção do Rei de Portugal, a amizade do Imperador Carlos V e de Dom Miguel da Silva, abrira certamente muitas portas.
Desta sua permanência em Roma, é a sua convivência com Miguel Ângelo, que maior curiosidade e interesse tem suscitado. A principal fonte desta amizade é a obra Diálogos em Roma, onde Miguel Ângelo, o principal interlocutor, exprime a sua teoria artística de inspiração neoplatónica. Muito se tem indagado, acerca da veracidade desses Diálogos.
A obra Diálogos em Roma é escrita com um tempo mínimo de intervalo entre as reais conversas com Miguel Ângelo e a redacção do texto, de pelo menos dois anos, o que significa que não podemos esperar uma cópia rigorosa das palavras dos intervenientes nos Diálogos, mas antes um registo de carácter genérico das opiniões de Miguel Ângelo.
É considerado uma fonte válida, pela riqueza das afirmações de Miguel Ângelo, expostas com admirável clareza, pelas questões tipicamente renascentistas e também pelos pensamentos neoplatónicos que lhe eram atribuídos, e que surgem no texto de Holanda com grande coerência.


O "Da Fábrica que Falece à Cidade de Lisboa" e o "Da Sciencia do Desenho", últimas obras de Holanda, terminadas em 1571, são as principais fontes de informação sobre a sua actividade e biografia no tempo que se seguiu à redacção do Da Pintura Antiga.
Estas duas obras marcam uma mudança profunda relativamente aos primeiros tempos. O seu entusiasmo juvenil dá lugar a uma amargura que procura a salvação na fé. No fim da sua vida, acaba por revelar uma atitude espiritual relativamente contrária à linha do humanismo renascentista.
Quanto ao conteúdo das mesmas, Da Fábrica que Falece à Cidade de Lisboa, é um tratado de urbanismo ilustrado, onde propõe uma série de obras para a capital do Reino. Holanda mantém vivo o desejo de com os seus conhecimentos servir o Reino, e de contribuir para uma maior segurança e aprimoramento arquitectónico de Lisboa. Nesta obra de urbanismo, Holanda tenta dar a Lisboa alguma dignidade, à semelhança do que viu in loco na Renascença italiana, vinte e nove anos antes aquando da sua viagem a Itália, em que D. João III o mandara desenhar as fortalezas e outras insignes obras de Itália. Nenhum dos seus projectos para Lisboa se materializou.
Enquanto arquitecto, nesta obra Holanda revela preocupações que abrangem a arquitectura militar, civil, religiosa, a higiene, a estética e o tráfego, manifestando assim uma visão altamente precursora, dinâmica e de carácter global para a cidade de Lisboa. Holanda revela também nos seus projectos as influências que recebeu da sua viagem a Itália, nomeadamente ao nível das fortificações e monumentos.

A sua biografia é extraordinária e paradoxal: de jovem cortesão entre príncipes e reis, a artista da renascença que privou com Miguel Ângelo, na sua estadia em Itália, à sua queda depois da morte do Infante Dom Luís e de D. João III. Até à sua morte, Holanda viverá retirado da vida social no seu monte em Sintra, entregando-se a valores religiosos e contemplativos. Holanda cai em desgraça e acaba os seus dias numa espécie de exílio de inspiração cristã. Há uma fuga da vida social para uma vida rural, mais próxima dos valores iniciais do cristianismo, para uma busca da pureza e da natureza. Numa desilusão amarga mas resignada, de índole monástica e contemplativa, Holanda retira-se para uma espécie de auto-reflexão.
Esta última fase da vida de Holanda é reveladora de um desencanto e de uma certa desistência. Consciente da sua idade avançada e da falta de interesse do Rei pelas artes, afirma que talvez depois de morto este o venha a lembrar, e a servir-se da Pintura.

Morre em 1584, com sessenta e seis ou sessenta e sete anos, em circunstâncias desconhecidas. Não se sabe ao certo se terá morrido em Lisboa, no seu Monte, ou em Santarém.






METAFISICA da CRIAÇÃO

A sua primeira e mais importante obra teórica é o Da Pintura Antiga, esta é também a primeira obra portuguesa a elaborar de forma exclusiva e sistemática uma reflexão acerca da arte.
O Da Pintura Antiga e os Diálogos em Roma compõem uma unidade, trata-se de um só texto que contém dois tratados, duas partes, cada um com o seu prólogo. 

Na 1ª parte Holanda expõe a sua teoria acerca da pintura e do pintor do ponto de vista filosófico, metafísico e estético.
A origem da pintura, tema que Holanda aborda em primeira instância no Da Pintura Antiga, é um tema que se prende com a problemática das primeiras causas, com uma metafísica da criação do mundo entendida como criação artística:

“Da fonte da pintura e primeira causa será o começo de nossa obra”[Da Pintura Antiga, pág. 19]


A metafísica da criação do mundo é entendida enquanto criação artística. A origem da pintura tem uma génese divina e significa não só, que Deus é a primeira causa da existência, mas também fonte e exemplo do poder artístico e criativo do homem.
Para Holanda, Deus é um Deus pintor e o mundo é retábulo pintado:

“Deus, quando quis pintar tudo o que vemos, como perfeitissimo pintor, sobre a escuridade e trevas que cobria o grão retábulo do mundo, começou logo com o claro, e por isso é mais nobre o claro que o escuro.”[Da Pintura Antiga, pág.19]

É da combinação e da variação cromática que provém toda a multiplicidade empírica. Mas o claro e o escuro não são elementos arbitrários, isto é, Deus pintou com o claro por cima do escuro. Para justificar esta afirmação, Holanda recorre à descrição da criação do mundo do Genesis:
Assim que disse Deus: Faça-se luz![PA, pág.19]

A acção demiúrgica de Deus, resulta da acção definidora da Luz sobre um escuro, que é caos informe. Em analogia com o gesto divino e criador de Deus, deve o pintor agir, isto é:
(...) a boa pintura com o claro se deve começar sobre o escuro: e não com o escuro, como todos fazem. Porque primeiro é a luz que a sombra; mas os mortais costumaram o menos de fazer e o mais conforme à miséria humana.[PA, pag.19]

A luz e a sombra têm para Holanda um papel estruturante, uma vez que, constituem a criação do mundo natural, mas também o tempo, isto é, o dia e a noite.
“E à luz chamou dia; e ao escuro e sombra, noite. E com luz e dia, cor perfeitíssima, pintou todas as coisas admiráveis que vemos, e não com a noite; com esta matizou ele as imagens encarecidas dos angélicos tronos e serafins e celestiais quadros que nas suas salas e paços tem, que nunca ainda vimos e esperamos de ver.”[PA, pág. 19]

Mais do que afirmar que a pintura é criação, Holanda afirma que a criação é pintura, na medida em que a pintura é criação de mundos. Esta concepção da pintura aproxima-se da teoria de arte platónica. Apesar de parecer que Platão se reduz a discutir a questão da poesia e dos poetas, é preciso lembrar que a palavra poiesis era correntemente usada para incluir toda a espécie de arte criadora.
“Em geral, chama-se à poesia a causa que faz passar algo do não-ser ao ser, de modo que as criações em todas as artes são poesias e os artesãos que as fazem são todos poetas.”[Platão, O Banquete – 205 c]

Também a acção artística de Deus resultou na passagem do não-ser ao ser. Todas as coisas do mundo e fora dele foram criadas com a pintura divina, mesmo a criação do homem é descrita como pintura:
“Ora mais claramente pintou ele por sua própria mão, tomando limo da terra e formando dela a proporção e fábrica do instrumento absolutíssimo que é o homem. Depois sobre a costa deste pintou a imagem da mulher Eva.”[PA, pág. 20]

Holanda estabelece a distinção entre a pintura divina e a pintura dos homens. Diz Holanda, logo no início do Da Pintura Antiga, que nas obras divinas transparece todo o exemplo e substância da arte da pintura. Porém, a pintura divina é animante e a dos homens, que deriva dessa, é inanimante.
Toda a metafísica da criação do mundo enquanto pintura animante, a ideia de um Deus pintor e dos pintores imitarem Deus quando pintam, poderá ser também compreendido como uma forma de legitimar a actividade artística, associando-a a uma génese divina e intelectual:
“A pintura diria eu que era uma declaração do pensamento em obra visível e contemplativa, e segunda natureza. É imitação de Deus e da natureza prontíssima”[PA, pág. 20-21]

O artista pintor, só o é à imagem de Deus, porque reproduz de forma inanimante o gesto demiúrgico de Deus, no momento da criação.
Holanda confere uma superioridade à pintura e ao pintor, no sentido metafísico cristão, mas não deixa de ser flagrante a influência marcante dos ideais humanistas do renascimento, presente nesta metafísica do homem-artista criador, também presentes em Alberti, Leonardo e Pico della Mirandola.
Este conceito holandiano de criação, marcado pela “criação divina” e pela “imitação de Deus”, vem ao encontro do pensamento neoplatónico, próprio do seu tempo:
“E é finalmente a pintura fazer e criar de novo numa tábua limpa e lisa, ou num papel cego e inobre, criar e fazer de novo quaisquer obras, divinas ou naturais (...)”[PA pág 21]

É desta maneira também, que Holanda irá legitimar a actividade artística, conferindo-lhe a dignidade de agir em conformidade com Deus, através da Pintura.
O artista, pelo exercício de sua arte, tem mais do que os outros homens, o privilégio de chegar até Deus «em casto spirito» (PA I, 8), de o contemplar e de o representar.

O artista pretende ser no fim do Renascimento, uma espécie de expoente máximo do desenvolvimento humano, entendido como microcosmos e como manifestação da reunião entre conhecimento intelectual e capacidade de criar.
O louvor do talento humano, coloca o homem entre o Céu e a Terra, conferindo-lhe a capacidade de decidir a sua própria natureza através da auto-realização, das suas escolhas que assentam na sua liberdade existencial.
A submissão à lei divina passa dá lugar ao livre arbítrio que conduz a acção humana, bem patente no antropocentrismo dos humanistas italianos:
“Na sua fase optimista, Ficino e os seus amigos não perdem nenhuma oportunidade de exaltar o tempo presente em que os trabalhos do arquitecto, engenheiro e do pintor demonstram a nobreza do espírito humano: através do exercício da Razão organizadora, o homem torna-se deus in terris.”[1]
[1] Eugénio Garin (direcção) – O Homem Renascentista, Lisboa: Editorial Presença, 1991, pág. 183

A presença de atributos divinos no ser humano, incitam-no a imitar Deus. Este desejo humano de ascender ao divino é natural ao humano tal como voar é natural ao pássaro, daí que Ficino defina o ser humano como um Deus na Terra:
“Est unique Deus In terris”

O elogio ao humano é feito em função desta posição semelhante à divina, o poder de concepção, e produção de formas é o vestígio do poder divino no ser humano:
“A Pintura (…) é imitação de Deus e da natureza prontíssima.”[1]
[1] Francisco de Holanda- Da Pintura Antiga, Lisboa: Livros Horizonte, 1984, pág. 20










Em Ficino, a grandeza do ser humano é um dos seus grandes temas filosóficos. Ele tenta demonstrar essencialmente que a origem dessa grandeza é incompreensível se não for atribuída ao seu lado divino e à imortalidade da alma.
Essa capacidade criadora prova à evidência que o homem não é um ser da natureza, mas um demiurgo que se aparenta com Deus.
Em Francisco de Holanda, a capacidade criadora do humano está em permanente relação com a divina. A pintura humana imita e reflecte a criação divina numa relação de dependência estrutural e mimética
Podemos sentir em Francisco de Holanda uma ressonância deste elogio do ser humano, não só naquilo que de comum tem com a tendência humanista, mas sobretudo nesta aproximação da dimensão humana à dimensão divina, legitimada não só pela capacidade de criar mas também pelo lado “divino” do humano, que se opõe ao seu lado animal, isto é, o pensamento e a imaginação, motores primordiais da criatividade.
A tarefa primordial do Pintor é imitar Deus no acto da Criação, com a ajuda das Ideias, tal como nos diz Miguel Ângelo nos Diálogos em Roma: “A excelente e divina Pintura, não é senão imitar com o ofício do Imortal Deus”.
O Artista, enquanto Deus in Terris, é-o tanto como o filósofo, ou o metafísico: destruidor da natureza e criador de “novos mundos do homem e para o homem”